sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Carta para a quinta geração de Giulia

Firenze, 27 de janeiro de 2017.


Querido filho, neto, bisneto, trisneto, tataraneto,

Scusa, este não é um documento oficial (para deixar de ser uma simples carta preciso registrar no cartório ou anagrafe, se fizer isto aqui em Firenze).

É. Nasci em Firenze. Berço Renascentista. Cidade que foi construída na época de Cristo. Uma das mais antigas, fascinantes e por isso, turística, da região de Toscana.

Minha mãe veio a Itália em um impulso de resgatar suas origens italianas e quando foi abraçada pela acolhedora cidade do seu avô, Giovanni Pitillo, sentiu que ali era como se fosse sua segunda casa. Depois disto foram 2 meses e 10 dias matando a saudade da família que não conhecia e reconhecendo a dupla cidadania em Castelluccio Inferiore, província de Potenza.

Vocês não consegueriam imaginar a emoção que a Mamma sentiu ao pegar um avião, trem e por fim chegar de ônibus nesta cidadezinha que sempre escutou seu avô apontar no mapa, quase ali no salto da bota, entre tantas histórias de guerras e amores que ele costumava contar. Ela chorou. E chorou mais algumas vezes ao conhecer a Nonna Maria, irmã do vô Giovanni, tão parecida com ele, no coração, alma e físico, Fui concebida ali mesmo. Imersa a tanto amor.

Quando meus pais, Alexandre Salinas Fontes e Ellen Pitillo, descobriram se estavam grávidos, foi mais do que 7 meses de espera. Dia após dia tiveram que reafirmar a decisão de que eu nasceria européia quando voltar ao Brasil seria a atitude mais fácil, estar perto da família, a mais esperada. Minha mãe deixou de ter a assistência médica que nunca lhe faltou, pois minha avó Cáritas é pediatra e abriu mão de estar rodeada dos melhores amigos, porque o País enfrentava uma crise econômica e política que influenciava diretamente na minha segurança e educação. A saudade pesou muito, imensamente, mas a vida é feita de escolhas sempre em busca de um futuro melhor.

Preciso falar aqui também sobre o meu sobrenome. Coisa que tanta gente julga tão banal, aqui na Itália é coisa séria: só se leva o cognome do pai. Portanto ali mesmo no Nuovo Ospedale San Giovanni di Dio, fui registrada dia 02 de dezembro de 2016 como Giulia Salinas Fontes. Para conseguir que minha mãe acrescentasse o Pitillo ao meu nome foram pedir diretamente ao Prefeito, explicar as motivações, diferença entre as culturas e o desejo de manter a tradição. Assim, depois de 4 meses, tiraram meu sobrenome Fontes e acrescentaram o Pitillo. Por isso, em alguns documentos, como minha primeira certidão de nascimento que foi retirada na Comune, vocês talvez encontrem um registro diferente, mas minha esperança é que isto não dificulte o reconhecimento da cidadania de vocês.

Como eu disse no começo desta carta, este não é um documento oficial, mas a prova de um legado jurisanguíneo que meus pais quiseram deixar para cada um de vocês, até a minha quinta geração. Espero viver para contar a história da nossa família com vocês no meu colo, assim como fez meu bisavô Giovanni. E não achem que é um sonho impossível, eu mesma tenho as duas trisavós com mais de 100 anos, mas se você receber esta carta por outra pessoa lembre-se que a mensagem é só uma: HONRE A SUA FAMÍLIA. ELA É A SUA CASA. PARA ONDE VOCÊ PODE SEMPRE VOLTAR.