sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Carta para a quinta geração de Giulia

Firenze, 27 de janeiro de 2017.


Querido filho, neto, bisneto, trisneto, tataraneto,

Scusa, este não é um documento oficial (para deixar de ser uma simples carta preciso registrar no cartório ou anagrafe, se fizer isto aqui em Firenze).

É. Nasci em Firenze. Berço Renascentista. Cidade que foi construída na época de Cristo. Uma das mais antigas, fascinantes e por isso, turística, da região de Toscana.

Minha mãe veio a Itália em um impulso de resgatar suas origens italianas e quando foi abraçada pela acolhedora cidade do seu avô, Giovanni Pitillo, sentiu que ali era como se fosse sua segunda casa. Depois disto foram 2 meses e 10 dias matando a saudade da família que não conhecia e reconhecendo a dupla cidadania em Castelluccio Inferiore, província de Potenza.

Vocês não consegueriam imaginar a emoção que a Mamma sentiu ao pegar um avião, trem e por fim chegar de ônibus nesta cidadezinha que sempre escutou seu avô apontar no mapa, quase ali no salto da bota, entre tantas histórias de guerras e amores que ele costumava contar. Ela chorou. E chorou mais algumas vezes ao conhecer a Nonna Maria, irmã do vô Giovanni, tão parecida com ele, no coração, alma e físico, Fui concebida ali mesmo. Imersa a tanto amor.

Quando meus pais, Alexandre Salinas Fontes e Ellen Pitillo, descobriram se estavam grávidos, foi mais do que 7 meses de espera. Dia após dia tiveram que reafirmar a decisão de que eu nasceria européia quando voltar ao Brasil seria a atitude mais fácil, estar perto da família, a mais esperada. Minha mãe deixou de ter a assistência médica que nunca lhe faltou, pois minha avó Cáritas é pediatra e abriu mão de estar rodeada dos melhores amigos, porque o País enfrentava uma crise econômica e política que influenciava diretamente na minha segurança e educação. A saudade pesou muito, imensamente, mas a vida é feita de escolhas sempre em busca de um futuro melhor.

Preciso falar aqui também sobre o meu sobrenome. Coisa que tanta gente julga tão banal, aqui na Itália é coisa séria: só se leva o cognome do pai. Portanto ali mesmo no Nuovo Ospedale San Giovanni di Dio, fui registrada dia 02 de dezembro de 2016 como Giulia Salinas Fontes. Para conseguir que minha mãe acrescentasse o Pitillo ao meu nome foram pedir diretamente ao Prefeito, explicar as motivações, diferença entre as culturas e o desejo de manter a tradição. Assim, depois de 4 meses, tiraram meu sobrenome Fontes e acrescentaram o Pitillo. Por isso, em alguns documentos, como minha primeira certidão de nascimento que foi retirada na Comune, vocês talvez encontrem um registro diferente, mas minha esperança é que isto não dificulte o reconhecimento da cidadania de vocês.

Como eu disse no começo desta carta, este não é um documento oficial, mas a prova de um legado jurisanguíneo que meus pais quiseram deixar para cada um de vocês, até a minha quinta geração. Espero viver para contar a história da nossa família com vocês no meu colo, assim como fez meu bisavô Giovanni. E não achem que é um sonho impossível, eu mesma tenho as duas trisavós com mais de 100 anos, mas se você receber esta carta por outra pessoa lembre-se que a mensagem é só uma: HONRE A SUA FAMÍLIA. ELA É A SUA CASA. PARA ONDE VOCÊ PODE SEMPRE VOLTAR.



segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Meu parto nada normal

Fui escovar os dentes (e me maquiar) e pensei: - Caramba, estou no hospital há 24 horas, mas se ainda consigo ser vaidosa, aqui vai longe. Por isso é melhor começar a contar minha experiência de parto normal antes que eu começa a esquecer alguns detalhes. Ontem reparei que perguntei a mesma coisa umas três vezes pro meu marido.

Vim fazer uma consulta na quarta, dia 30, e a obstetra me disse que como estava completando 40 semanas, tinha anemia, diabetes gestacional, 3 miomas, fiz cirurgia bariátrica era melhor ser internada e iniciar uma indução. Eu fiquei feliz da vida. Não iria fazer a cesariana que sempre imaginei mas tinha uma tarde pra resolver detalhes práticos como depilar, revisar a mala de maternidade, comprar um supositório (hahaha, a vida como ela é). 

Era dia 1 de dezembro. Sempre amei dias primeiros. Foi quando comecei a namorar o nego, depois nos casamos. Ou seja, motivo de comemoração. Nunca deixei passar. Algumas pessoas fazem uma revisão dos sonhos no ano novo eu costumo a fazer todo começo de mês. 

Então acordei às 5h12. Bebi um chá mate que minha mãe trouxe do Brasil. Esquentei um pão com queijo pra comer no caminho. Fomos de train. 1,20 euro. Transporte público eficiente. Fui observando a paisagem do caminho que já tinha feito tantas vezes mas agora com 4 graus negativos de temperatura tinha uma geleira nas folhas especial. Adoro quando sai aquela fumacinha da boca. 

Assim chegamos "quase" pontualmente às 8h no Hospital Toregalli. O Careggi era outro hospital que eu poderia ter escolhido, mas por causa da experiência das meninas da igreja que tiveram seus filhos recentemente, de uns 8 meses pra cá, e por o Toregalli agora se chamar Novo Ospedale San Giovanni di Dio, achei inspirador prestar mais uma homenagem ao meu avô e ao meu padrinho. 

Logo que cheguei fui fazer o traciato. As enfermeiras colocam 2 faixas na sua barriga pra medir os batimentos cardíacos do bebê. Com um botão em mãos você indica quando seu filho se move (no intervalo de 1 hora é ideal que ocorra 5 vezes). E enquanto isto elas verificam a pressão da mãe. 

A Giulia nunca se movimenta nestes exames. Aí as enfermeiras se preocupam, pedem pra eu ficar de pé, me mexer, deitar virada de lado, até que eu explico que ela puxou a mãe e não vê nenhum sentido de acordar se não for pra comer. Ou seja, meu exame sempre se estende porque tenho que comer durante o processo. Elas pedem pra ser um chocolate (sonho meu), sempre como pão de queijo ou esfirra que é o que o marido fez e tem na mochila.

Depois de terminado o traciato elas registram no computador o resultado dos últimos exames e te encaminham pro ginecologista. O doutor verifica o nível do liquido amniótico e se iniciou a dilatação. Estou há 3 semanas com dilatação de 1 dedo (não sei o que significa em centímetros mas tem que chegar a 10).

De lá a enfermeira me levou pro quarto que vou ficar (stanza 14, cama 141) e enquanto não era encaminhada para consulta com a obstetra aproveitei pra conhecer as outras gestantes que ficariam comigo. Somos 4 no total. Todas teriam filhas meninas. Uma fez cesariana mas a filha estava separada dela no ambulatório, outra está aqui há 2 semanas porque a gravidez ainda é de 32 semanas mas estava sentindo muitas dores e acharam melhor ela ficar, e a última terá gêmeos hoje a tarde. Estou louca pra ver a carinha de todas estas bonecas. Tem um bebê chorando no corredor sem parar há umas 20 horas então acredito que não será nenhum problema ter 5 bebêzinhas fofas no nosso quarto.

Às 11h me chamaram pra ver a obstetra. Ela poderia ter me dado 3 opções de indução mas como meu colo do útero ainda estava espesso preferiu o modo mais natural e lentoooooo. Disse que não era pra ficar ansiosa porque neste caso poderia levar de 2 a 3 dias pra nascer.

Aí voltei pro quarto e tinha que ficar deitada por 1 hora pro gel não escorrer. A partir daí começou a fazer efeito. Eu achei que aquelas contrações de 3 em 3 minutos durando 20 segundos cada era o auge da dor, mas nem imaginava o que ainda estava por me esperar.

Às 2h da tarde começou o horário das visitas. Finalmente chegou a renca pra saber das novidades. Meu pai não conseguia comer, só sentia vontade de vomitar. Meu marido estava com tontura e numa ansiedade sem tamanho. Como só um podia entrar no quarto, mamy linda se apossou da cadeira e ninguém a tirava de lá. Meu pai e o Alexandre ficaram no corredor, então sempre que ocorria um update eu ia lá pessoalmente contar.

Uma das vezes que fui, estava em pé em frente eles, e a bolsa rompeu. Um momento  mágico. Aquele líquido amniótico escorrendo pelas pernas num jato forte e constante. Eram 4h40 da tarde. Enquanto minha mãe (que derepente começou a falar italiano: la borsa é rota) chamava a enfermeira, o nego me dava apoio pra poder caminhar até algum lugar que eu pudesse colocar um absorvente. 

A enfermeira me parou e fez outro exame. Disse que agora as contrações iam ficar mais fortes. De 60 a 100% de dor. Minha média era 55. Mas ainda eram contrações na parte de baixo da barriga que significava que só o colo do útero estava ficando macio (antes ele tem a textura de um nariz e já estava como a de uma boca).

A noite não seguiu como eu pensava. As dores não me deixavam de 1 em 1 minuto mas não dilatei nada. Na manhã seguinte a obstetra estava fazendo visitas no quarto e me viu contorcendo de dor. Assim me chamou pra ser a primeiro na consulta.

Ela viu que apesar de ter rompido a bolsa há 18 horas e liquido amniótico estar normal eu só tinha dilatado mais um dedo. Pediu pra eu fazer outro traciato e neste eu mal conseguia me manter. Tive descolamento de placenta e taquicardia fetal. Liguei no whats up do nego e disse calmamente. São 10h30. Sei que as visitas começam  às 2h.
Mas você pode pegar o ônibus e vir calmamente pra cá.  Faço elas te deixarem entrar. Ele achou que eu estava com muitas dores e precisava de apoio mas eu estava na sala de parto sendo preparada pra um questionário de perguntas. Dentre elas: quando foi a última vez que sentiu ela mexer e minha resposta foi: ela não se mexe há muitas horas.

Então veio outra médica e falaram: sinto muito te dar esta noticia mas vai ter que assinar este termo pra fazermos uma cesarea. Sei que já está em trabalho de parto há 24 horas mas não podemos mais esperar. Eu disse: Graças a Deus.

Me sentei. Enfiaram uma agulha enorme na coluna e logo a anestesia peridural pegou. Eu sentia as 7 médicas me virando mas não adormeceu completamente. Era mais um calorzinho.

A obstretra Elizabetta com seu colar de perolas vermelhas, me perguntou se eu era modelo, qual o nome da minha filha e fez a ordem às outras: são 11h34. Sejam rápidas. 2 minutos depois eu já estava escutando o choro forte dela. Ela chorou e eu senti uma lágrima escorrendo no canto do meu olho. Levaram pra medir e pesar na pediatra. Enquanto isto só fiquei olhando pra luz do teto e agradecendo a Deus pela vida que me foi presenteada.

Assim que trouxeram ela pra eu conhecer, continuando o berreiro mais lindo que eu já tinha escutado, colocaram ela no peito que acalmou imediatamente e abriu os olhos mais negros e japoneses. Lembro que pensei: - não se parece com ninguém.

Passado 5 minutos levaram pro pai que ficou com ela no colo, duro, na mesma posição por meia hora. Depois deram banho e colocaram um look amarelinho (tanto que 3 pessoas se confundiram achando que era menino). 

Ela mamou o colostro do meu peito. 30 minutos em cada e foi conhecer os avós da parte de mãe. Eu vi a cena um pouco de longe, deitada na maca. Meus pais e o padrinho Matheus abraçando o Alexandre. Chorando de emoção e dizendo que nunca viram nada tão perfeitinho. (Eu não achei, pra que fique claro, mas amanhã deve desinchar bem. Espero). 

Foi uma tiração de foto, postagem, contar a novidade pra familia até a hora que o papai da Giulia foi embora às 22h30. E a mãe ficou, anestesiada, com sonda pra fazer xixi e soro no outro braço, sem poder levantar da cama, mas tentando por durante 7 horas fazer a filha parar de chorar, só revesando o peito. Tenho fé que uma hora o cansaço vence a gente e vamos dormir. Quem sabe daqui uns 30 anos por aí...

No segundo dia, tudo andava calmo. Saber que no outro dia estaríamos em casa era como um anestésico. Não que eu pudesse reclamar por já estar 1 dia sem comer, mas aquele caldo ralo in brodo da comida do hospital não era o suficiente quando se está mal acostumada com um chef particular.

Meu irmão, um dos padrinhos, veio de Brighton para vê-la. Eu estava felicissima por isto. Todo mundo sabe que ele é o amor da minha vida e também poderia entreter nossos pais com outros passeios até dar a hora da visita: das 1h às 6h.

Quando ele tinha acabado de tirar fotos lindissimas com ela e ido pro corredor esperar eu fazer minha bateria de exames que ia desde injeção de acido folico, outra de ferro, oxitocina, limpeza do corte da cirurgia, prelievo para novos exames, antiflamatórios, lavagem com balde e aplicação de supositório, chegou uma enfermeira pegando a Giulia da culla (ao lado da minha cama) e dizendo: - Estou levando sua filha. Ela pegou uma infecção grave por termos demorado muito tempo para fazer a cirurgia depois que a bolsa se rompeu. Se despeça dela porque vai ficar 5 dias na terapia intensiva recebendo antibiótico na veia e não poderá receber visitas.

Neste momento, o que eu não chorei quando ela nasceu, chorei ao ver minha filha sendo tirada de mim tão frágil e pequenina. Eu tinha acabado de ouvir um audio do Benjamin dizendo que estava bravo com todo mundo porque estava com ciúmes da Giulia. Muito fofoooo, tanta saudade que tinha me feito soluçar.

Mas não se compara ao susto que o Alexandre levou ao ver o berço da filha sair do quarto e sua mulher atrás chorando e curvada de dores, inclusive na alma.

Ela não poderia mais ver os avós até quinta. 1 semana depois de quando cheguei aqui. A não ser por meia hora através de um vidro, como um ser intocável.

Já eu seria chamada toda vez que ela chorasse pra amamentá-la e meu marido poderia ficar com ela das 11h às 22h.

A primeira bateria de exames foi terrivel. Furar os pezinhos, mãozinhas e braços pra colocar a sonda e vê-la ser ligada à aparelhos pra monitar a frequência cardíaca e a respiração. Engraçado que outro dia perguntei se furavam a orelha dela no hospital e perguntaram totalmente chocados se fazem isso com bebêzinhos no Brasil?????

Foram dias e noites longas e duras. Me dividir entre o segundo e o terceiro andar da maternidade. Fazer meus exames e acompanhar os dela.

Um bom exemplo do significado da maternidade foi ontem, às 6h da manhã, quando 4 médicos começaram a medir minha pressão, tirar 3 potinhos do meu sangue pra exame, dar antibiótico na veia, colocar supositório, fazer tomar comprimidos de ácido folico, ferro, fazer curativo no meu corte da cirurgia, dar injeção de oxitocina na bunda, chegaram 3 pessoas pra eu votar pra mudar ou não o País, e a diabetologista pra eu escolher o cardápio do almoço (que sempre foi minestrone ao brodo, ou seja macarrãozinho de criança com caldo knor de verdura mesmo que eu escolhesse pasta ao pomodoro) ao mesmo tempo ainda na cama. Derepente aparece uma enfermeira na porta: - corre pro segundo andar que sua filha está chorando. E você larga tudo parecendo o corcunda de notredam e ainda tem que subir escada porque o elevador não parava no andar.

Ela sempre pegou o peito direitinho. Aqui o verbo é chuchar. Chuchava a madrugada toda e pela manhã não queria saber de acordar.  Isto fez com que ela engordasse 200 gramas no primeiro dia, mas perdesse 150 no segundo. 3 doutoras vieram falar comigo em idiomas diferentes: italiano, inglês e espanhol. Achavam que eu não tinha entendido a necessidade de tirar o leite e deixar no refrigerador caso, pesando ela antes e depois de cada mamada, não tivesse absorvido 40 gramas de leite por vez. Sei que o colostro alimenta até mais do que o leite, mas o organismo só absorvia umas 16 gramas. Então passei a não dormir, não comer, não ir ao banheiro. Com a diferença que em casa eu teria ajuda. Aqui eu troco a fralda, aviso as enfermeiras se fez xixi ou coco, peso, amamento, peso, cortinado, tampar a luz do rosto, espera e vai.

Mas a verdade é que eu não queria correr o risco deles darem mamadeira pra ela e meu leite não descer ou ela não querer mais saber de sugar. É trabalhoso. Pensa que não.

No quarto dia saiu o leite. Veio jorrando. E mesmo estando em andares diferentes quando meu peito enche sei que ela quer mamar. Vou pingando. Isto fez com que regulassemos nossos horários a cada 2h.

E os dias seguiram assim até quarta, quando fomos liberadas pra voltar pra casa. Eu acordei às 5h da manhã, me maquiei e fiquei pronta pro médico me liberar, o que aconteceu ao meio dia. Depois foi só pegar alguns remédios na farmácia pra continuar o tratamento de antibiótico por mais 3 dias em casa. Mas a infecção praticamente tinha curado. 

Foi tão inesperado que ao chegarmos em casa nem meus pais estavam. Tinham ido conhecer o Jardim di Boboli. Então apresentamos o novo lar pra Giulia, esperamos a vovó Cáritas pra dar o primeiro banho e tudo parecia calmo demais quando a noite chegou. Giulia não estava adaptada. Nem a gente. Eu não precisava pular da cama, esperar elevador, correr de um andar pro outro, mas também não tinha as ferramentas certas pra trocar uma fralda, e ela se recusava a fechar os olhinhos. Foram 8 horas em claro, entre soluços, choros, cólicas, e nós tentando interpretar porquê ela resistia tanto descansar.

Hoje, 10 dias depois, estou com infecção nos grampos da cesariana. Isto mesmo, não fui costurada e sim grampeada. E eles estão cheios de pus. Como se a cada pequeno movimento fincassem mais na minha pele. Já os quilos, que tantas mulheres se preocupam em perder e eu, tão inchada, nem lembrei de pesar, perdi todos que ganhei na gestação  (9 quilos - meio a mais dos que cheguei aqui na Itália). 

Este foi meu parto. Um deles. Porque o que prevejo é que agora serão 1 por dia.


quinta-feira, 29 de setembro de 2016

O que está faltando no enxoval da Giulia

Nos últimos dias meus amigos estão mandando mensagens, super ansiosos, porque me perguntam o que falta pro enxoval da Giulia e eu digo tudo, na maior calma do mundo. Eu não quero deixá-los preocupados, mas eles não tem a menor obrigação de me encher de presentes.

Resolvi fazer uma listinha pra você que, assim como eu, é mãe de primeira viagem e acha que pra um bebê chegar no mundo só precisa de leite e amor. E dizer que 2 meses ainda dá tempo de se organizar. Respira fundo e vai.

O que está faltando no enxoval:

Kit higiene:

Trocador de fralda
Fraldas
Pomada de assadura
Sabonetes
Shampoo


Kit berço:

Protetor pra colocar no vao entre o colchao e o berco (almofadado)
Cortinado (tem muitoooo pernilongo aqui)
Babá eletrônica
Cabides


Kit amamentação:

Camisolas com abertura na frente
Calcinhas pós parto
Absorvente de seio para colocar no sutiã



Sei que algumas amigas que já tiveram filhos vão falar que a lista é muito maior do que esta, mas este são com certeza os itens essenciais.

O primeiro comboio do Brasil sai agora no mês de outubro. Meus pais vem dia 25 de novembro. Meu irmão 1 de dezembro. E minha irmã com minha sogra dia 13 de dezembro. Espero todos vocês aqui. Estão super convidados. Não demorem muito tempo pra comprar a passagem. Somos uma família de andarilhos que gosta de morar cada ano em um lugar.

Beijocas e muito obrigada.



domingo, 18 de setembro de 2016

Eu escolho ficar

Vivemos diariamente a consequência das nossas escolhas. E isto é incrível quando você tem a maturidade suficiente pra entender que não existem escolhas certas ou erradas.

Passei 35 anos acreditando que não tive escolha, fui escolhida.
Lembro quando me apaixonei a primeira vez. Eu deveria ter uns 8, 9 anos. Ele era o menino mais levado da turma, faltava aulas, não fazia as tarefas (na verdade, eu fazia pra ele), lembro de uma vez ele pular o muro pra fumar e eu ficar do outro lado vigiando se nenhum professor aparecia. Um dia, quando tínhamos 12 anos fiquei sabendo que ele tinha sido preso. Bom, digamos que percebi que eu não iria casar com este cara. Eu era nerd, sem graça, gordinha, ele nem sabia meu nome e eu dançava quadrilha todos os anos com um garoto um pouco menor que eu. Não tinha escolha. Eu era uma cabeça maior que meus colegas. Era como ser o último na divisão do futebol. Sobrou você. Fazer o que? Vem pro meu time. Mais tarde também fiquei sabendo que este menino ficou 6 anos pedindo pro papai noel pra crescer e ficar à minha altura.

Levei uns anos para me apaixonar novamente. Eu tinha 14, tranças no cabelo, macacão jeans. Era a única que não usava maquiagem. Ele tinha 16. Era da minha sala porque supostamente repetiu 2 vezes o primeiro ano. Não ligava dele ser mais velho, o que importava é que era lindo e não dava bola pra ninguém. Mais uma vez meu radar ligado no impossível, imprevisível. Como juntar uma menina, que sempre foi segundo lugar da sala, absolutamente tímida com o carinha que sentava no fundão? Então um dia, precisamente, 20 anos atrás, foi aniversário de 15 anos da nossa amiga e eu tinha acabado de voltar da Disney, o qual foi uma experiência péssima, pois eu não tinha idade pra viajar sozinha, não porque não era responsável, mas porque era tão tão responsável que nenhuma menina da minha idade queria dividir o quarto com a nerd, sem graça, gordinha que não sabia nem qual era sua cor preferida. Bom, mas o importante é que comprei um DVD pra um amigo do meu pai e ele me deu de presente 100 reais por ter trazido a encomenda, o que me fez comprar meu primeiro vestidinho preto, da Ellus, e eu estava linda, dançante, finalmente com os cabelos soltos e ele me chamou pra conversar. Foi assim que dei meu primeiro beijo e a Amanda me ligou no outro dia dizendo: - Sonhei que você deu seu primeiro beijo. Aí na segunda, de volta a aula, vi uma foto dele de quando tinha uns 12 anos de idade. Ele não estava tão bonito assim e eu pensei que nossos filhos também não seriam bonitos e resolvi parar de sofrer depois de uma semana alugando o ouvido do meu melhor amigo e fazendo poemas pro menino mais disputado da sala.

Depois de uns 4 meses, numa tarde de estudo como todas as outras, só que na minha casa, um amigo, o primeiro lugar da sala, nerd, sem graça, magrelo, me deu um selinho durante uma brincadeira de verdade e consequência em que preferi a consequência já que nunca gostei muito da verdade. E ele me disse que sabia que eu não gostava dele, que teria vergonha de contar pra turma, então a gente poderia namorar em segredo até que eu começasse a chorar por ele e fazer poemas. Mais uma vez eu fui escolhida. Então chegou a hora do vestibular. Nos mudamos de cidade. A gente mudou muito. Ele se tornou uma pessoa absurdamente interessante. Eu perdi uns quilos e ganhei umas espinhas.

E em Ribeirão meu radar atacou novamente. Me apaixonei logo no primeiro dia pelo veterano que deu meu trote e ficou com todo dinheiro que arrecadei no semáforo para fazer um churrasco. Eu era nerd, sem graça, caipira. Ele era o menino de sobretudo preto e coturno rock and roll que ficou com a minha melhor amiga porque não queria nada sério com ninguém. Depois de uns 3 meses, tive sorte do bad boy entender que o lado negro da força não combinava muito bem com o que tinha por trás daquele óculos escuro redondo e ele se tornou o cara mais bonzinho do mundo. Tão bonzinho que depois de 5 anos o relacionamento acabou. Por telefone, Sem dor, Como tinha de ser.

Aí voltei pra Goiânia. Arranjei meu primeiro emprego. Emagreci 20 quilos, E derepente, depois de 1 ano sem beijar ninguém, apareceu um menino no serviço. Este era o pior dos piores. Meu radar quase teve um colapso. Tinha uma noiva, usava drogas, amigos barra pesada e se interessou pela menina nerd, sem graça, careta, eu. Foi quando dei graças por nunca ter podido escolher e mais uma vez fui escolhida.

Um dia depois do meu aniversário, feliz por ter feito a festa infantil dos meus sonhos e ter convidado todo mundo que um dia já tinha conhecido, meu nego começou a trabalhar no meu serviço. Sentou na minha frente. Eu definitivamente não vi nada nele. Mas ele começou a fazer poemas, postar no fotolog que criou pra mim, me convidou para ir num festival de música sertaneja que certamente não era o seu gosto musical, me levou pro pit dog e disse: A gente tem que gostar de quem gosta da gente. Agora eu vejo que já sabia disso, a vida estava me ensinando desde que eu tinha 8, 9 anos, mas poucas pessoas dão realmente oportunidade pra isto acontecer. Elas já vem carregadas de senãos, de manias, de predileções, ou é como eu sempre sonhei, sem defeitos, sem brigas, sem abrir mão, ou nada feito. Ou ele chega perfeito, com as palavras certas, o olhar devastador, o jeito de pegador ou melhor ficar sozinha. Bom, sou a prova viva que precisamos dar uma chance. Não só para os relacionamentos, mas pra nós mesmos. Eu sempre fui escolhida. E ficava completamente sem entender o que uma pessoa tão boa via numa nerd, sem graça e gordinha. Acho que por isso tinha tendência a me interessar pelos caras maus. Inevitavelmente sabia que um dia terminariam comigo e eu já estaria esperando por isso.

Eu levei uns 8 meses para me apaixonar pelo meu marido. Primeiro tive que conhecê-lo, me conhecer, ajustar muitos pontos, descobrir cada um dos seus lados e perceber que eu amo até do avesso. Depois passei por uma fase de: como ninguém vê o quanto ele é a pessoa mais especial deste mundo? O que posso fazer pra mostrar como ele é um homem bom? Por fim eu percebi que não precisava provar nada pra ninguém. Infeliz daquele que não tem a oportunidade de conviver com ele diariamente, que não consegue enxergá-lo com os olhos do coração. Foi aí que eu vi que eu não fui escolhida.

Nós escolhemos dia a dia respeitar nossas vontades e estimular os sonhos.
Nós escolhemos admirar cada uma das milhares de qualidades.
Nós escolhemos nos surpreender com as novidades que nunca param de surgir,
Nós escolhemos conversar, conversar, conversar e só parar na hora de dormir pra também poder contemplar o silêncio que habita ali dentro.
Nós escolhemos que nossa casa é o melhor lugar pra se estar porque quando abrimos aquela porta temos certeza que encontraremos o sorriso mais sincero e alegre.

E todos os dias eu escolho ele, pois o seu coração é o meu lugar.


A luz de dentro

Tem um momento do dia que é simplesmente mágico.
O sol entra por aquela janela como se eu tivesse esquecido de desligar a luz do quarto.
Ainda não é noite. Não tem o gosto amargo de quando você dorme pela manhã e quando acorda o dia já passou. Não dá a impressão de que foram mais horas em vão no vazio da insignificância.
São os últimos raios de sol. E você bem que poderia ter desejado por meses uma trégua do calor, mas nunca de sua luz. É lindo. Palpável. Se você pára para observar, mesmo que apenas como expectador, consegue sentir a mão divina pairando ali, a presença dos seus pais protegendo, acolhendo.
Então você se dá conta que sim, é apenas mais um dia que talvez você nem tenha saído do sofá, mas você fez muita coisa: gerou uma vida de maneiras que seu corpo, alma e coração nem acreditam. Uma vida que está aprendendo dia a dia, assim como você, a dar o seu melhor para sobreviver a este mundo louco.
Tem um momento do dia que é simplesmente mágico e você sabe, não porque te contaram, você simplesmente sabe que não está sozinho.

quinta-feira, 30 de junho de 2016

Honey Baby

Minha honey baby,
Quando eu tinha uns 19 anos meu amigo Gustavo, um grande músico e redator, sentou no chão de casa em Ribeirão Preto e só saiu de lá quando conseguiu me ensinar a tocar Vapor Barato no violão. Desde então eu nunca toquei outra canção. Só intercalei ao cantar Espumas ao Vento, mas tocar mesmo foi a única que consegui aprender. Obrigada Gu.

Minha honey baby,
Há 1 semana você se materializou na minha frente. Passou a não ser apenas um sonho de 20 anos atrás. Eu e minha mãe fomos em uma ginecologista e ela tentou de tudo saber seu sexo. Fez ultrassom, intravaginal, e você só bocejava e dava xauzinho. Abrir as pernas de jeito nenhum. Super calma e recatada. Chocólatra igual a mãe eu já sabia que não era. Essa foi até umas das supertições que me fizeram acreditar que eu estava esperando um menininho.

Já estava me dando por satisfeita quando a médica resolve dizer: - mas posso dar um palpite? e antes que eu pudesse dizer: - não, pelo amor de Deus, não aumente minha expectativas senão nem vou dormir... ela disse: - acho que é menina. E uma lágrima saiu dos meus olhos.

Aí você já pode imaginar que eu não tive mais sossego. No outro dia estava indo pra Uberlândia matar a saudade dos meus avós e tias. Ia ter um chá de bebê organizado com tanto carinho pelos meus padrinhos. E eu não ia compartilhar com eles o melhor momento da minha vida?

Minha honey baby,
Mandei um whats up pro Tio Guto que me disse: - Posso fazer um ultrassom se você chegar em Uberlândia até 5h30 da tarde. Meu pai correu o máximo que pode pra chegar, mas só chegamos 6h40. Então meu tio não desistiu. Reabriu o hospital e fez o exame em mim. Foram mais 50 minutos virando, revirando e você tranquila, sentadinha, no máximo dava uma espreguiçada. Levantei, dei uma sambadinha, fiz acrobacias e ele disse: - é uma menina. Minha mãe segurou em minha mão, beijou meu rosto, ela tinha o sorriso maior deste universo. E eu falei: - Não quero nem ver. Aí ele mostrou pra minha mãe, em um monte de borrão, que tinha 2 rachadurinhas. Tem que ter muita fé e experiência pra ver algo ali.

Antes de chegar no carro já liguei pro nego. Era1h30 da madrugada em Firenze, mas ele ainda estava no trabalho. Saiu um pouco do barulho do restaurante e eu disse: - Quer saber se é menino ou menina? e ele: - É a Júlia, lógico. E eu confirmei: - É a nossa Júlia. Ele gritou: - Não acredito! Foi um momento mágico.

Depois deixamos o tio Guto na casa dele e a tia Adriana me deu um sapatinho amarelo mais fofo deste mundo. Ao chegar na vó Diná, a tia Mara já estava esperando lá embaixo e perguntou: - É a Júlia, né? Quando eu afirmei que sim com a cabeça, ela pulou tão alto e vibrou com as mãos que nunca vou me esquecer desta cena. Foi lindo madrinha. Obrigada. Ela dizia que tinha certeza, que sempre acreditou na espiritualidade e esta menina estava destinada a mim e ao Alexandre. Foi aí que eu chorei.

Minha honey baby,
Subi pra contar pra minha vovucha, o tio Naninho e meu pai. Afinal, só ele e o Alexandre acreditavam que era você. Afinal, como eu disse: eu parei de comer chocolate assim que você existiu em mim. Só dava bola pra alimentos bem salgado; senti dores extremas do segundo ao terceiro mês, todo dia você inventava uma coisinha nova; eu emagreci 9 quilos no primeiro mês de gravidez e minha barriga é super pontuda, só cresce pra frente. Vê só? Todos os indicadores me fizeram pressionar seu pai a começar a escolher o nome do seu irmãozinho e na lista já tinha: Vicente, Vinicius, Vitor, Max, Lorenzo...

Mas no final das contas, era você. Sempre foi você. E vir passar estes 10 dias no Brasil pra ganhar mimo de todos e voltar reernegizada pra começar uma vida nova na Europa foi a melhor decisão que eu poderia ter tomado.

Obrigada família por todo apoio, carinho, dedicação, presentes. Nada vale mais do que a família e agora ela só vai crescer.




sábado, 18 de junho de 2016

Pra voce nascer foi um parto

Apesar de tudo, gosto de colecionar historias. Tenho total consciencia de que quando uma pessoa te pergunta como foi a viagem ela nao quer saber em detalhes toda trajedia do seu dia. Pior ainda quando me perguntam: a gravidez esta tranquila? E eu resolvo a dizer a verdade desta grande saga. Tem gente que pergunta e ate sai andando sem ouvir sua resposta... Entao se voce ainda nao saiu andando, vou contar o que me aconteceu ontem.

Esta historia era pra se chamar: Pra dancar CREU tem que ter disposicao, mas como nao cheguei a desembarcar no Brasil achei mais apropriado: Pra vocer nascer foi um parto. Pois e meio assim que me sinto agora, tendo que ter meu filho sem qualquer assistencia medica como as mulheres de antigamente. Sozinha e completamente dilacerada.

Passei a semana tentando comprar a passagem para o Brasil. Eu, minha mae, o alexandre, o matheus tentamos pela tap, britisjh airlines, aireuropa. Mas toda vez que a gente ia efetuar a compra ou caia a conexao ou a companhia aerea mandando um email dizendo que a reserva nao tinha sido concluida, mas pra tentarmos realizar uma compra era preciso esperar 24 horas. Por fim, mesmo querendo viajar na quarta me conformei que teria que adiar ate sexta, pra chegar em guarulhos sabado pela manha. Nesta altura do campeonato nem nos importava mais se a passagem de 2500 ja estava custando 4000.

Entao ontem ao meio dia fui ate a estacao pegar um trem para o aeroporto. Brighton fica a 1 hora de Gatwick. Nao consegui taxi e fui empurrando uma mala de 27 quilos ate la. Deve dar uns 25 quarteiroes. Chegando na estacao comprei um ticket para as 12h30 e fui vendo a cada minuto os trens sendo cancelados um a um. Tive que esperar ate 2h da tarde pra finalmente sair o primeiro, completamente lotado.

Como eu sempre saio bem antecipado, so teria que apertar um pouco o passo. Ao chegar no aeroporto, fui fazer o check in e o senhor diz que nao tem nenhuma passagem em meu nome, muito menos uma reserva com o localizador que eu havia impresso. Ele vai ate a gerencia e depois de alguns miutos volta dizendo que a passagem nunca havia sido comprada. Da um trabalhao pra reaver minha mala que ele havia acabado de passar pela pesagem.

Entao ele me manda para o quiosque de informacoes do aeroporto, que ja sabe do meu problema mas diz que nao pode ajudar pois o voo esta lotado e se eu pudesse comprar aquela hora estaria quase o dobro do preco. Mas eu poderia tentar com a central.

O que e esta central? A Aireuropa onde todas funcionarias so falam espanhol e pra eu conseguir falar com elas tive que sair do aeroporto, procurar um orelhao, descobrir como discar e ficar 40 minutos colocando moedas ate ser ouvida por 9 mulheres e finalmente a ultima conseguir me ajudar. "Em partes". Ratica, este era o nome da mulher, com toda sua boa vontade manteve o valor de quase 800 libras e tentou passar o cartao de credito. Uma, duas, tres vezes. Ate que disse: voce tem que falar com seu banco e perguntar porque nao esta passando e voce tem que fazer isto em 10 minutos senao perde o voo e a reserva.

Nesta altura eu ja estava em prantos. Como eu ia explicar pra Ratica que todas minhas moedas tinham acabado, que eu nao sabia o telefone do Santander e se eu tentasse ligar pro Brasil aquela hora o banco nem estaria aberto? Resolvi entao contar com a sorte. Voltei pro quiosque do aeroporto, disse que estava tudo acertado e que era pra eles passarem o cartao na maquininha que eu pagaria ali mesmo.

Ufa, passou. Ou ao menos acreditei nisso.
Fui fazer o check in, o cara desconfiou. Mas embarcou a mala.
Fui passar no raio x, o cara desconfiou. Pediram para eu tirar quase toda roupa e ainda fui bipada passando por uma revista especial. Mas me liberaram.
Fui passar pela alfandega e eu so disse: Me deixe voltar pra casa.
Fui passar na sala de embarque e quando apresentei o cartao: - Espere um momento senhora. E vieram 2 guardinhas verificar e deixar eu passar.

Ja estava em cima da hora mas o grupo de turistas adolescentes, uns 49, estavam se divertindo a todo gas. Sem sinal de que nos chamariam pra entrar no aviao nos proximos minutos. Passaram 2 horas e eu definitivamente ja estava preocupada pois perderia a conexao em Madrid para o Brasil, quando nos chamaram pra entrar. Uma fila desorganizada se formou e eu fiquei bemmm atras. Mas finalmente entramos no aviao. Quando eu acomodava minha bagagem escutei a comissaria dando um aviso: - Voces precisam descer. Chamamos 2 engenheiros para verificar uma pane eletrica. Seguranca em primeiro lugar.

Neste momento eu entendi. Era este o aviso que estavamos esperando do destino. Estava tudo dando errado, mas a pane foi descoberta antes de embarcarmos, entao toda onda de ma sorte acabaria ali e viajariamos saos e salvos. Pelo menos era isso que eu queria acreditar.

Voltamos para o saguao e ali eu fiquei mais 5 horas olhando para o grande telao que indica qual o novo portao de embarque. Confesso que cheguei a me deitar no chao por alguns minutos, tentando acomodar a barriga. Eu e os outros 49 adolescentes que nesta hora eu nem estava achando mais insuportavelmente felizes e estridentes assim. Derepente aparece no telao: dirijam-se ao service desk.



Bem nesta fila escuto um grupo de brasileiros tentando conseguir um voo direto pro Brasil. Eles ja tinham feito todo o dever de casa. Ja sabiam que o proximo pro Brasil so sairia as 23h do dia seguinte, entao teriamos que ir pra Madrid as 10h da manha e esperar no aeroporto mais um dia inteiro. Ou... foi ai que eu entrei na historia. - Ola, voces tambem vao pra Sao Paulo. E a Leidiane brincou: - Opa, voce esta gravida? Vamos cortar esta fila.

A gente se juntou e fomos todos (eramos 6, assim como na novela, lembrou o Abner), tentar achar uma solucao. Neste momento ficamos sabendo que ainda tinhamos que esperar todos chegarem pra pegar as malas e esperar novamente por instrucoes. Mas para isso teriamos que "entrar" novamente em Londres e isto significava pra dois dos nossos atuais colegas que estavam ilegais ha 3 anos a possibilidade real de serem deportados ao invez de seguirem para um hotel com a gente com tudo pago. Apesar de que este negocio de assistencia da companhia acho uma lenda, ja era 10h da noite eu passei o dia todo sentada no chao, sem comer, nem beber agua. Nao ia ser de uma hora pra outra que comecariam a ser prestativos. Voltando aos colegas, tentei ajudar com todo meu ingles que nao fossem condenados e expulsos. E inacreditavelmente os guardinhas entenderam que era melhor eles irem embora com a gente, pois ja haviam comprado a passagem, do que terem um custo maior deportando os rapazes.

Agora ja tinha amigos pra me ajudar a carregar as malas, me darem agua, fruta, e ainda emprestar o celular. Eu tinha passado o dia incomunicavel e era crucial avisar minha mae pra ela cancelar ou comunicar a Avianca que eu nao pegaria o voo de Guarulhos pra Goiania, avisar o Ben que nao veria a madrinha as 5h da manha de hoje, avisar o nego que estava tudo dando errado, mas no final, tudo daria certo. A recompensa valeria a pena.

Foi ai que o inesperado aconteceu. Minha mae nao se contentou em escrever no whats up e me ligou no celular do menino. Do outro lado, chorando, me pediu: Filha, nao entre neste aviao. Seu pai esta ha dias sem dormir preocupado com o Zica virus (ainda mais aqui no Jao) e depois de tudo que aconteceu nao so hoje, mas toda esta semana, nao queremos que voce venha ate ter nosso bebezinho.

Imagina a cena: eu era a primeira de uma fila imensa esperando respostas de que hotel eles nos mandariam e que horas seria exatamente o nosso voo, e quando dei por mim ja estava sentada no chao aos prantos. Eu falava coisas aparentemente sem sentido pra minha mae.
- Maeeee, eu nao sei cozinhar, quero pamonha.
- Maeeee, daqui 1 ano quando o bebe puder fazer uma viagem internacional, eu nao sei como estarao minhas vovuchas.
- Mas maeeee, eu vou pegar uma infeccao aqui, eu preciso saber se o bebe esta bem, eu estou numa gravidez de risco, eu so vou ser atendida daqui um mes, ninguem comeca um pre natal com 5 meses de gravidez, eu tenho 2 chas de bebes esperando por mim, nos vamos descobrir o sexo do bebe juntas....
Mas nao adiantou. Tive que respeitar a intuicao da minha mae que nunca chorou muito menos e do tipo de acreditar nessas coisas.

Corri pra pegar o ultimo trem pra Brighton e apesar de parecer que tinha sido ha meses atras, eles continuavam com o mesmo problema de manha, estavam sendo cancelados. Cheguei na estacao 11h40 e esperei por meu irmao que minha mae jurou que estaria la pra me ajudar com a mala pois eu nao tinha um centavo pro taxi. Esperei meia hora pra garantir que ele nao iria mesmo e nao iriamos nos desencontrar. Ai pedi o celular emprestado pra uma menina e ele me disse pra eu pegar o taxi que ele ja iria pra porta pagar pela corrida.

Chegando no meu irmao finalmente consegui conectar no meu celular e apesar de tudo que havia vivido e da inconformidade de passar os proximos 16 dias sentada no sofa do meu irmao, eu havia recebido uma mensagem ainda pior. O pai de uma das minhas melhores amigas havia falecido e eu nao estaria la pra consolar ela hoje. Eu nao estaria la no proximo ano, e eu nem tinha direito de sentir tamanha dor em meu peito. Um senhor extraordinario, um marido admiravel, um ser humano unico, um pai amoroso e nenhuma palavra neste momento seria capaz de dizer o quanto eu sentia muito, e sentia saudade do tio, e sentia nao ter o poder de tirar um pouquinho da dor dela e passar pra mim.

Foi nesta hora que chorei, chorei, chorei ate dormir.